Na zona rural de Itapetim, sertão pernambucano, permanece quase que intacto o sítio aonde um ex-dirigente do Movimento de Libertação Popular (Molipo) - posteriormente assassinado na Bahia pelas forças da repressão - sonhou instalar, no início dos anos 70, uma base rural para enfrentar a ditadura militar brasileira que por duas décadas comandou o País com mãos de ferro. Trata-se do Sítio Baixio, localizado a 02 quilômetros do centro de São Vicente, um distrito de Itapetim, município distante 430 km do Recife, a capital de Pernambuco.
Propriedade típica dos sertões nordestinos - ou seja, praticamente sem benfeitorias, apenas uma pequena casa de tijolo aparente e um barreiro para juntar a água da chuva-, o Sítio Baixio é de tamanho modesto (cerda de 10 hectares) e entre 1971 e 1974 pertenceu ao advogado baiano João Leonardo da Silva Rocha, um dos 15 presos políticos brasileiros libertados em troca do embaixador americano Charles Burke Elbrick, seqüestrado pela guerrilha de esquerda em 1969. Banido do Brasil, ao retornar, João Leonardo se instalou ali.
É claro que João Leonardo não chegou a São Vicente usando o seu nome verdadeiro. Ao adquirir o Sítio Baixio, ele se passava por José Lourenço da Silva, ou Zé Careca, apelido que ganhou da gente simples do lugar, pessoas como José Vital de Siqueira, o Zé de Vital, 63 anos, agricultor aposentado, que hoje lembra da vida no sítio do amigo: “Era um sítio igualzinho aos outros daqui. De vez em quando, ele chamava e nós ia caçar. Depois, ele ficava lá, cuidando de umas roçinhas bestas e ouvindo um rádio Siemens que ele tinha”.
Quando teve que sair de São Vicente por suspeitar que os militares tinham descoberto o seu projeto (Veja no texto seguinte, a resumida biografia de João Leonardo da Silva Rocha), Zé Careca deixou o Sítio Baixio aos cuidados da companheira sertaneja com quem viveu um grande amor e disse: “Se eu não voltar, faça o que quiser com tudo isso aqui que também é seu.” Como João Leonardo jamais voltaria, Virgínia Paes de Lima (a companheira hoje também falecida) cuidou do sítio até vendê-lo ao atual proprietário, Geneci José de Siqueira.
A casa do sítio ainda mantém o fogão a lenha onde o comunista cozinhava.
Embora preservado, atualmente o Sítio Baixio pouco produz: serve apenas para pequenos plantios de milho e feijão em épocas de chuva e funciona, também, como ponto de apoio para Geneci José de Siqueira (que não mora ali) encurralar seis vacas leiteiras. Além disso, tudo ali são apenas lembranças do tempo em que João Leonardo sonhou com uma base rural para impulsionar a luta contra a ditadura militar. Um sonho que nunca se concretizou: pelo contrário, resultou no trucidamento de ativistas políticos de esquerda como ele e tantos outros.
A passagem de João Leonardo da Silva Rocha pelo distrito de São Vicente foi um tanto misteriosa - e não poderia ser diferente uma vez que ele viveu ali na clandestinidade. Assim, hoje pouco se sabe do ele fez (ou pretendeu fazer) ali. Mas, muitos têm consciência de que o Zé Careca foi um importante personagem da recente história política brasileira. Tanto que o prefeito da cidade, Adelmo Moura, decidiu, no início de agosto, propor à Câmara Municipal mudar o nome da praça central de Itapetim para Pça. João Leonardo da Silva Rocha.